Transtornos mentais afetam mais mulheres do que homens, revela OMS
- Felipe Targino e Jean Guimarães
- 13 de jan.
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Atualizado: 14 de jan.
Fatores genéticos e sociais contribuem para que distúrbios psicológicos atinjam, em maior número, o público feminino
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), uma em cada oito pessoas no mundo possui ao menos um distúrbio psicológico. Além disso, dados da Organização revelam que mulheres são duas vezes mais propensas a desenvolver transtornos de ansiedade e têm três vezes mais chances de desenvolver depressão do que os homens. Os fatores vão desde alterações no sistema endócrino, em períodos como o pré-menstrual, o puerpério e a menopausa e as desigualdades de gênero, que abrangem a jornada dupla ou tripla de trabalho, pressão estética e violências psicológicas e físicas; uma vez que mulheres lidam com riscos maiores de sofrerem algum tipo de abuso nos ambientes que frequentam. Vale destacar que o conceito de saúde mental engloba também a saúde física e o bem-estar social, afetando todo o meio em que a pessoa está inserida.
No recorte brasileiro, uma pesquisa feita pela ONG Think Olga revela que 45% das mulheres brasileiras desenvolveram ansiedade, depressão ou algum outro tipo de transtorno psíquico. Chamado “Esgotadas: O empobrecimento, a sobrecarga e o sofrimento psíquico das mulheres”, o relatório foi realizado em 2023 e entrevistou mais de mil mulheres com idades entre 18 e 65 anos. Ainda de acordo com o estudo, quatro em cada 10 mulheres vivem estressadas, 26% das entrevistadas afirmaram que os padrões de beleza impostos pela sociedade afetam a saúde mental delas, 16% dizem ter medo de sofrer violência de gênero.
Outro problema comum são as tarefas domésticas e a responsabilidade de tomar conta do lar e dos filhos. A pesquisa mostra que mulheres são as únicas provedoras em 38% dos domicílios brasileiros, sendo a maior parte delas negras, com mais de 55 anos e de classes sociais mais baixas. O relatório mostrou que a jornada de trabalho, que muitas vezes é dupla ou tripla, foi apontada como segundo fator de maior esgotamento do público feminino, ficando atrás apenas de questões financeiras.
A psicóloga Nadyla Chagas, de 32 anos, relata que a desigualdade de gênero e a sobrecarga de trabalho colocam as mulheres sob constante pressão: “Tudo isso afeta a saúde mental das mulheres, porque coloca elas sob constante pressão para equilibrar responsabilidades profissionais, domésticas e familiares. Essa jornada que às vezes se torna tripla para a maioria cria um ambiente de manutenção de estresse, o que causa exaustão mental e emocional”, explica. Essa pressão muitas vezes pode causar a sensação de insuficiência e falta de reconhecimento.
Diante de todos esses sentimentos, quadros de ansiedade e depressão podem se agravar. Segundo a psicóloga, a preocupação excessiva, irritabilidade e, com frequência, a tensão muscular são sintomas do transtorno de ansiedade muito presente nas mulheres. Quando o assunto é depressão, Nadyla afirma que os sentimentos mais frequentes são tristeza persistente, falta de interesse em atividades básicas, alterações do sono e do apetite e a sensação de fadiga.
As diferenças de gênero estão presentes no atendimento psicológico por conta de alguns fatores como o ciclo hormonal e o papel social das mulheres, que funcionam de forma diferente em relação aos homens. Nadyla comenta essas diferenças influenciam o atendimento prestado por ela: “O atendimento feminino exige uma especificidade diferenciada. A gente está falando de indivíduos que lidam com fatores biológicos como ciclo hormonal e papéis sociais pelos quais os homens não são afetados. Isso demanda tratamentos que considerem essas especificidades, então a gente tenta promover estratégias terapêuticas personalizadas e sensíveis às necessidades femininas”, explica a psicóloga.
Ao falar sobre o ciclo hormonal feminino, Nadyla relata que essa fase acaba afetando diretamente o equilíbrio emocional das mulheres, uma vez que há alterações de humor, o que causa o aumento da ansiedade, principalmente em momentos como gravidez, menopausa ou mesmo a TPM (tensão pré-menstrual), em que os sentimentos ficam mais intensos. Portanto, fatores biológicos influenciam e deixam o corpo feminino mais sensível aos transtornos psicológicos.
Há mais de 10 anos na terapia por causa de seu quadro de ansiedade, a advogada Christiana Alves, de 28 anos, revela: “Tenho problemas com a autocobrança, com o ímpeto de querer sempre controlar as variáveis do que na minha cabeça poderia dar errado.” Segundo a advogada, o sentimento de autocobrança tem, sim, a ver com o padrão imposto pela sociedade para mulheres, pois elas se sentem muitas vezes insuficientes em suas obrigações. Alves acredita que isso é um sentimento comum no público feminino.
De acordo com ela, existe um grande preconceito com tudo que envolve a saúde mental. Apesar do avanço dos últimos anos, ainda há um estereótipo de que terapia é coisa de pessoas malucas e há resistência em desmistificar isso, sendo essa dificuldade maior no público masculino. Para a advogada, as mulheres sofrem “uma clara sobrecarga e acúmulo de funções, que é ainda normalizada, o que leva aos grandes níveis de estresse, burnout etc. Já com relação aos homens, o machismo entra no cenário, logo que buscar ajuda no tema de saúde mental é vista [por eles] como fraqueza”, completa.
Publicado por: Gabriela Feliciana